quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Manifesto de Banksy


Extraído do diário do tenente coronel Mervin Willett Gonin que estava entre os primeiros soldados britânicos a liberar Bergen-Belsen em 1945

Não consigo dar nenhuma descrição adequada do campo de horror no qual os meus homens e eu tínhamos de passar o próximo mês das nossas vidas. Não passava de um local estéril inóspito, tão estéril como um galinheiro. Corpos jaziam por todo o lado, alguns em montes enormes, algumas vezes jaziam sozinhos ou em pares onde tinham caído. Demorou algum tempo a habituar a ver homens, mulheres e crianças a desfalecer enquanto passavam por eles e resistir ao impulso de ir ao seu auxílio. Cada pessoa tinha de se habituar à ideia que o indivíduo não contava. Todos sabíamos que estavam a morrer quinhentas pessoas por dia e que outras quinhentas pessoas por dia iam morrer durante semanas até que algo que nós tivéssemos feito surtisse o mínimo efeito. Era, no entanto, muito difícil ver uma criança a asfixiar com difteria quando sabíamos que uma traqueotomia e alguns cuidados básicos chegariam para a salvar, víamos mulheres a afogarem-se no próprio vómito por estarem demasiado fracas para se voltarem, e homens a comer vermes enquanto agarravam um pedaço de pão unicamente porque eles tinham de comer vermes para sobreviver e naquele momento pouca diferença sentiam. Pilhas de corpos, nus e obscenos, com uma mulher fraca demais para estar de pé encostada a eles enquanto cozinhava o alimento que lhe tínhamos dado; homens e mulheres agachados por todo o lado aliviando-se da disenteria que lhes irritava as entranhas, uma mulher completamente nua lavava-se com sabão e com a água de um tanque onde os restos mortais de uma criança flutuavam.
Foi pouco tempo depois da Cruz Vermelha Britânica chegar, embora possa não haver ligação, que uma grande quantidade de batom chegou. Isto não era nada do que nós homens queríamos, estávamos a clamar por centenas e milhares de outras coisas e não sabíamos quem tinha pedido batom. Só queria descobrir quem foi que o fez, foi uma acção de génio, brilhantismo puro e inalterado. Creio que nada fez mais por estes prisioneiros que o batom. Mulheres jaziam nas camas sem lençóis ou camisa de noite mas com lábios escarlates, víamo-las a vaguear com nada mais que uma manta nos ombros, mas com lábios vermelho escarlate. Vi uma mulher morta na marquesa de autópsias que ainda agarrava o batom com as mãos. Finalmente alguém fez algo para fazer destas pessoas indivíduos de novo, eles eram alguém, não mais somente o número que estava tatuado no braço. Finalmente eles podiam ter algum interesse na sua aparência. Aquele batom começou a devolver-lhes a sua humanidade.

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